A Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro não está em sua melhor
fase. Todos estão a cada dia mais temerosos, devido a uma série de assassinatos
dentro do campus. O suspeito é
apelidado de Mariposa Negra, devido a sua assinatura peculiar nas vítimas.
No entanto, apesar de ser o assunto mais comentado pelos corredores, a
reitoria precisa impedir que seja também falado fora de seus domínios. Assim,
faz de tudo para abafar o caso e manter a ilusão de um clima de paz.
O problema
é que os homicídios estão se tornando mais frequentes, gerando pânico entre
todos os funcionários e estudantes. Vendo que muita coisa não sairia por parte
das autoridades, um grupo de alunos curiosos decide, por conta própria,
procurar o(a) responsável por tais atrocidades antes que seja tarde. Será que
conseguirão desvendar esse mistério a tempo? Só lendo para saber.
“Já notou como são interessantes as maneiras com que as pinceladas do
destino vão ilustrando e, até mesmo, moldando as cenas tomadas pelos percalços
em nossas vidas?
Conheci esse livro através do bookstagram. Li uma resenha dele e achei a
proposta interessante. O autor, parecendo ler meus pensamentos, me ofereceu um
exemplar pouco tempo depois.
Claro que não perdi tempo em aceitar (rsrsrs). Só
não tinha ideia de que seria uma experiência tão fora da caixinha.
Para começar, eu já li muitos livros ambientados no Rio de Janeiro. Até
comento que fico em uma espécie de bolha, porque boa parte das minhas leituras
nacionais se passam em terras cariocas ou paulistas.
Mas nunca tinha lido um
que se passava, especificamente, na Baixada Fluminense (a região onde moro, bem
longe do glamour dos cenários de
novelas).
Não apenas isso, o escritor trouxe uma vivência dele mesmo pelos
corredores de sua instituição de origem, a Rural do Rio de Janeiro, que muitas
vezes é esquecida pelos próprios estudantes ao prestarem vestibular (devido à
sua localização um tanto insólita). Entretanto, independente do endereço, o
clima acadêmico não muda.
Assim, como uma também ex-aluna de universidade
pública, me senti em casa por diversos momentos, conforme lia as cenas da
rotina dos protagonistas.
A narrativa, ainda, quebra paradigmas. É em primeira pessoa, porém sua verdadeira
identidade é uma surpresa, que me deixou de queixo caído várias vezes.
Entretanto, conforme descobrimos mais sobre o(a) narrador(a), entendemos o
porquê de ter uma visão tão ampla dos acontecimentos.
Além disso, os alunos metidos a detetives são verdadeiras figuras.
Valério (ou Val, para os íntimos) e Lady são os meus favoritos.
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Foto: Hanna Carolina/Mundinho da Hanna |
Eles fazem
parte de um andar específico dos alojamentos, onde vivem os representantes da
comunidade LGBTQUIA+. A própria descrição do motivo para ter um andar apenas para
eles já é uma espécie de preconceito escancarado por parte da universidade.
Ao
mesmo tempo, pelo fato do próprio autor ser ex-aluno e representante da
comunidade aqui retratada, tem conhecimento de causa para contar a sua vivência
diante de tantas situações constrangedoras e marcantes ao longo de sua formação.
No entanto, a turma, que se chama carinhosamente de ‘as monas do aloja’,
não baixa a cabeça para ninguém. São incríveis. Mantém sua autoestima alta e foram,
de longe, os melhores integrantes do livro inteiro.
Val é nosso protagonista.
Tem uma personalidade bastante peculiar, assim como um idioma próprio. Confesso
que demorei para me conectar com a linguagem dele, quase recorrendo ao Google
para tentar entender o que estava contando.
Felizmente, conforme a leitura avança, certas palavras se tornam comuns
entre as monas. Então, podemos dizer até que aprendi uma língua nova depois
dessa obra, de tão familiarizada que fiquei (rsrsrs).
Lady, por sua vez, é uma travesti muito descolada. Sempre para cima e
tentando ajudar seus amigos da melhor forma. É um amor de pessoa.
Mas também
sabe dar uns belos puxões de orelha quando necessário. Foi, de longe, a
personagem melhor desenvolvida da trama. E terminei a leitura querendo ser
amiga dela na vida real.
Juntos às demais “monas do aloja”, formam uma bela equipe investigativa,
que me lembrou bastante os episódios de Scooby-Doo.
Isso porque, mesmo diante
do perigo e medo iminente, mostraram que podem ser bem-humorados e corajosos na
hora certa. Além disso, por trás de um comportamento distraído, existem olhos e
ouvidos atentos a quaisquer pistas que levem à real identidade do(a)
assassino(a).
“Minha avó sempre dizia: ‘não confie em ninguém que tem tantas rugas na
testa’.”
Enquanto eles tentam salvar o dia, fazendo justiça do jeito certo, a
reitoria é representada por Elizabeth, que não parece concordar com a
iniciativa dos alunos.
De acordo com ela, tudo é válido quando a reputação da
universidade está em jogo. Nem que seja recorrer a métodos escusos para
resolver sem a mídia saber.
Ler a forma como a vice-reitora lidou com o assunto é repugnante e
assustador. E o pior é saber que não é apenas uma ficção, pois passamos por
situações semelhantes quase todos os dias em instituições públicas e o modus operandi obedece ao mesmo padrão.
Dessa forma, me senti lutando ao lado dos alunos revoltados diante de tais
atitudes absurdas.
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Foto: Hanna Carolina/Mundinho da Hanna |
E quem brilha nos holofotes são Danila e Ângela. A primeira é uma
verdadeira líder estudantil. Nada passa barato em sua gestão e ela não perde a
oportunidade de levantar seu megafone e berrar aos quatro ventos o que está
errado. Por outro lado, Ângela é a típica defensora de política da direita. Filha
de militares e faz de tudo para que eles subam ao poder e controlem os
estudantes (alguma semelhança com a realidade?).
Aos poucos, vemos como o autor conseguiu encaixar de forma espetacular
diversos temas, sem que a trama se perdesse no meio do caminho. Então,
preparem-se para diversos mistérios dentro de mistérios, dentro de outro
mistério, como uma verdadeira boneca russa.
Cada um deles traz à tona assuntos
importantes, como preconceito, homofobia, racismo, disputas políticas e
corrupção deslavada.
“O ponto é que a humanidade, por mais individualista que seja, sempre
tenderá à coletividade.”
Tudo envolto em um clima de suspense noir,
com toque de comicidade e até espaço para romance. Além disso, conforme as
páginas passam, todas as pontas se amarram, mesmo que seja por cenas
aparentemente desnecessárias.
Aliás, minha única reclamação em relação a elas é
que poderiam ter sido resumidas em poucas páginas, tendo o mesmo sentimento de
surpresa.
Contudo, nem por isso o livro deixou de me fazer de trouxa. Toda vez que
eu pensava ter resolvido o caso (uma detetive profissional, discípula de Holmes
e Poirot, rsrs), o autor me dava uma rasteira e eu ficava com cara de boba.
Inclusive, a primeira vez que isso aconteceu, eu estava em público e agradeci
por ainda estar de máscara no meio do trem. Minha vontade era de berrar, mas só
pude ficar com cara de paisagem e quase perdi minha estação, tentando entender
o que tinha acabado de ler (rsrsrs).
“Os olhos enganam, o reflexo pode esconder muito mais que uma imagem...”
Mas nem assim eu me preparei para outros possíveis momentos do tipo.
Então, obviamente fui feita de trouxa mais e mais vezes, até o final que,
aliás, é digno.
Assim como já vinha sendo mostrado ao longo da obra, o escritor
amarrou todas as pontas com maestria e fechou o arco de forma satisfatória. No
entanto, o narrador ainda traz mais enigmas, que deixam o leitor sem saber se
realmente a trama termina ali, ou se ainda teremos notícias suas em breve.
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Foto: Hanna Carolina/Mundinho da Hanna |
Falando sobre o livro em si, existem as duas versões (impressa e ebook). Eu li a digital, então posso
comentar que tem uma diagramação agradável à leitura, com uma fonte adequada.
No entanto, a revisão carece de mais cuidado nas próximas edições, pois ainda
passaram alguns erros de digitação. Mas nada que atrapalhe a experiência como
um todo.
A capa, por si só, é direta e objetiva. Toda em tons sombrios e possui
elementos condizentes com o que veremos na história.
Porém, a próxima edição
merecia uma capa mais bonita, ao menos no tamanho da tela inteira do kindle. Em resumo, é um livro que adorei
conhecer e recomendo, especialmente se curtem uma salada de temas sem sentido que
se conecta depois.
Essas foram minhas considerações. E aí, já leram esse livro ou algum
outro do autor? Curtem suspense do tipo noir?
Me contem aí!
Olá.
ResponderExcluirFiquei bem curiosa quando você disse que a verdadeira identidade do personagem te deixou de queixo caído. Deu vontade de ler essa história.
Beijos.
www.parafraseandocomvanessa.com.br
Que bom, Vanessa. Espero que goste da leitura também, =)
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